quinta-feira, março 16, 2006

Lisboa


Está uma noite calma, escura e fria. Cai uma chuva miudinha que me gela os ossos e petrifica o coração. Não sei bem o que fazer. Andar pelas ruas desertas, à chuva, parece ser a única escolha plausível neste momento.
Este lugar é um deserto de cimento. As árvores estão despidas, carentes. Ninguém as aprecia, ou olha sequer. Seres outrora vivos, depois esquecidos e abandonados. A falta de memória é tão típica do Homem. Abandonar parece ser uma tarefa tão fácil como respirar. Nem sei como não lhes custa respirar. Respirar, sentir, existir, arde, queima, corrói bem fundo no meu ser. Porque nem alma tenho. Troquei-a pela coisa mais falsa e traiçoeira que existe. Dei-a em troca daquilo que julgava ser a felicidade, em troca de nada.
Nesta terra ninguém vive, ninguém existe. Todos são sombras de um passado fugaz. Toda a gente grita, mas ninguém ouve senão os seus próprios sons de agonia.
O céu está escuro e salpicado de estrelas. É tudo tão brilhante lá em cima… Os candeeiros da rua ofuscam o olhar, cegam-me da realidade, porque é tudo mentira. Eu não existo, eu não sou ninguém. Tu não és ninguém, nós não somos nada, um grande aglomerado de ninguéns perdidos, iludidos com a sua aparente existência, com as suas vidinhas insignificantes e sem sentido.
Eu olho e não vejo, porque mesmo durante o dia é tudo escuridão à minha frente.
Sem rumo, sem sentido, sem destino, vagueio à deriva. O que é uma casa senão uma gaveta onde nos fechamos para nos escondermos? O que são os sentimentos senão objectos que usamos para nos magoarmos?
Quero fugir, esquecer aquilo que sou. Guardei as palavras numa caixa e lancei-a ao rio. Muito antes de tu chegares já eu não era ninguém. Porque me turvas o olhar e porque preferiste ignorar-me quando eu ainda existia?
A chuva aumentou o seu ritmo de queda. O estado psicológico piora a cada momento que passa. Preciso que me dês a tua mão. Preciso que me iludas com novas histórias, que me enchas de novas esperanças falsas.
Esta rua é interminável, este caminho parece não ter fim à vista. Acho que, inevitavelmente, tenho esperanças que olhes bem fundo nos meus olhos e que percebas a intensidade com que vivo, com que morro, com que chamo por ti numa suplica amargurada e melancólica que rompe a minha tentativa inútil de ser alguém. Porque eu fui feita para existir e não para agradar aos outros, e existir é a única coisa que não consigo fazer.

Agora que esta rua chegou ao fim e Lisboa se torna um ponto luminoso atrás de mim, a chuva começa a diminuir gradualmente. E no fim de contas, no fim de tudo, esta tristeza que me consome deita-me por terra. Chega de lutar contra algo que é certo. Então deixo-me ficar aqui deitada e tu, tu nunca vais chegar a tempo de me salvar de morrer lentamente às portas de Lisboa.

[Preciso de uma aspirina e de ampolas de bom humor.]

4 Comments:

At 16 março, 2006 21:22, Blogger Postiga said...

Eish que confusão que vai para aí...

 
At 16 março, 2006 23:36, Blogger RS3 said...

Eu adoro o a parágrafo do segundo bold. Nice ending. Hei-de inventar essas ampolas...xD

 
At 17 março, 2006 18:16, Blogger patiXa_ said...

É o caos meu querido Postiga, é o caos!

 
At 19 março, 2006 02:25, Blogger T. said...

hum...parece-me que lisboa anda mm a dar que falar!

gostei..sabes k sim!=)

 

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